Bunga. Na barriga do tempo

Extraordinário testemunho, o de Carlos Bunga hoje (16.5.2019) na ESAD.CR, sobre o (seu) trabalho e a (nossa) Vida. Conferência Arquitectura da Vida, a convite de Samuel Rama. A arquitectura da arte explicada na primeira pessoa. Que bonito e profundo, e um orgulho para esta Escola e esta cidade ter ajudado a ‘produzir’ um humanista deste calibre.
The man behind the cardboard. The man. Que «utiliza o cartão mas não fala dele». Que através das sete vidas do papel e da fita-cola, e depois do desenho, do manipular pequenos e grandes objectos, e finalmente do comunicar da memória dos gestos (res)salva a temporalidade da performance – o conceito – para assim edificar a cidade numa dimensão ainda para lá das ideias. «São peças que não terminam com a exposição, antes continuam até… ao infinito». São pois coisas, que nenhum discurso seria capaz de conter, seja o da arquitectura, do urbanismo ou da antropologia. Ou da história e suas ruínas.
Choreographing spectatorship por esse mundo fora. Convocando-nos. A nomad of a mind like very very few. Para quem desconstruir e desfazer não é o oposto de construir e fazer. Sabedoria budista, oriental, ecos de Gutai e Gordon Matta-Clark. A síntese de tudo na obra de um criador para quem a casa começa sempre pela memória (da barriga da mãe) e a memória se transforma sempre numa casa (que levamos connosco e com os nossos genes – assim como os recebemos). Num fluxo.
De onde vem esta vitalidade, este energia? O encontro com a sua própria linguagem permanece um processo e sobretudo um desafio em aberto, literalmente hands on. Mas depois também usa as palavras e com uma fluência, uma generosidade, uma clareza e um rigor absolutamente desarmantes. A ternura da verdade. This might well be one of the last artists using metaphor to empty out its intrinsic distancing function to establish a fully conversational plane of imanence. Corpo e mente, ideia e conceito, acção e superfície num mesmo gesto. Exemplar. Obrigado.
No final da conferência, a uma pergunta de uma aluna, sobre se a essência do trabalho estava desde o início da vida ou se foi sendo descoberta durante o percurso, Bunga respondeu, assumindo a paternidade do vazio: «o que fazemos é o resultado do que somos». O que um grande artista faz é pelos vistos continuar a ser curioso (desde a barriga da mãe, isto é, da própria noite dos tempos) o suficiente para continuar a descobrir intuitivamente, em consciência, como dar forma à sua missão. Corpo ao futuro. Sent from my iPhone.
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PS Na mesma tarde, no MAAT, Bunga viria a ‘desfazer’ a seu construção durante uma performance. Fica a espreitadela para detrás do (des)edificado.

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